Ao Anjo Pálido, dono de todas as artes
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Entonce foi anssim que tudo começô? Uma gota de mer e o amor se fez. A vida ficô linda de uma hora pra otra. E o jardim tão fremoso que dava gosto. Dipois, ocê cansô de vê tudo certim, tudo tão alinhado que resorveu aprontá uma arte. Daquelas de criança matreira que acha graça é na desgraça dos otros. Foi aí que trocou o mer pelo sar. As coisas desandaram e o mundo virô de ponta cabeça. O amor murchou que nem pranta que fica direto no sor. Sem trato. E veio a fenecê. Caiu-se mortinho da silva. Sem mais nem porque. E, daí de cima, ocê aplaudia, anjo marvado! E eu achando que eu devia de merecê tudo isso, por ter sido sempre uma pessoa das avessas. Deve de sê castigo dos deuses - a mãe dizia - ocê é muito ruim, menina. E por um bocado de tempo, acreditei nisso mais que tudo. Acabei ficando jururu. Quase que doente da alma. Mas acontece que otro anjo apareceu e resorveu devorvê o mer que ocê me tirô. O sor vortô a brilhar onde antes era só chuva. E eu até que prefiro anssim. Porque dipois da chuva o sor é mais bonito. E no meu jardim tem bem mais frô que antes. E que num morrem nunca, nunquinha.
[Cris, a que sonha.]
[Cris, a que sonha.]
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